Friday, November 10, 2006

“Não apresse o rio, ele CoRRre sOzInHo...”

Meus queridos filhos!

Ajudem os humanos! Tenham paci^encia. Eles são muito burrinhos...

Há 20 anos atrás a Mamãe era assessora de imprensa da Usiminas, uma grande e poderosa empresa la em BH. O Vov^o tinha aposentado nessa mesma empresa e quase todo mundo que trabalhava la conhecia a Mamãe como filha do Seu Bomfim. Tinha chefe que a Mamãe ate chamava de tio.

A Mamãe já era vegetariana e, como a gente tinha de almoçar la, a cantina sempre tinha opções adequadas aos problemas de saúde ou escolhas alimentares dos vários empregados. (Que chique não e mesmo? Mas a Mamãe não percebia isso não!)
Todo dia, depois do almoço, a Mamãe passeava por 30 minutos nas redondezas do prédio. Naquela época, aquela parte da cidade não era muito povoada e a mata da Universidade Federal de Minas Gerais era preservada em frente ao edifício, que era todo envidraçado. A vista era linda! A gente ate enxergava no fundo lagoa da Pampulha. Ou seja, aquele era um lugar agradável de se trabalhar e a Mamãe tinha muitos amigos la.

Então um dia, a Mamãe começou a achar que seria muito chato ficar trabalhando la por 30 anos, fazendo as mesmas coisas todos os dias e depois aposentar. Então, a Mamãe começou a pensar em um jeito de mudar aquela situação. Nas férias, quando a Mamãe estava passeando na Inglaterra, ela ficou sabendo de um mestrado em Jornalismo Internacional, em Londres. Era o ultimo dia da Mamãe naquela cidade. Então ela preparou tudo, deixou as malas arrumadinhas e, como o v^oo era muito tarde aproveitou o dia para conhecer a BBC de Londres, na época, a maior rede de comunicação do mundo. La, a Mamãe conheceu uma estagiaria que estava fazendo o tal Mestrado que a Mamãe tinha ouvido falar. E a Mamãe pensou assim:
- Esse e o sinal de que devo me candidatar ao curso.
Chegou no Brasil. Mandou os documentos, o currículo e o projeto de pesquisa. O trabalho da Mamãe foi aceito e seis meses depois a Mamãe estava voando para Londres, onde passou três longos anos fazendo o curso e estudando muito. Muitas vezes a Mamãe sonhou que estava trabalhando na Usiminas, conversando com os colegas, de tanta saudade! Nessas horas, a Mamãe se perguntava porque ela estava fazendo todo aquele sacrifício, se anteriormente a situação dela era tão boa.
Depois da saída da Mamãe da empresa, muita gente foi demitida com muitos anos de casa. Alguns reagiram. Outros entraram em depressão. Outros adoeceram com câncer e outras doenças e alguns ate morreram. E a Mamãe tinha começado uma nova etapa na vida dela! Com muita luta, e verdade, mas um novo cenário se descortinava `a frente da Mamãe. De jornalista, a Mamãe virou professora de jornalismo na mesma Universidade onde tinha se graduado e começou uma nova carreira, com novos desafios. Na verdade, a Mamãe tinha seguido o sonho dela e nada e mais gratificante do que realizar um sonho. Não ter ficado naquela de: Ah, se eu tivesse tentado!...

O tempo passou. A Mamãe evoluiu na carreira. Mudou para Arcos. Ganhou experiência e ai um dia a Mamãe se perguntou, se ela devia ficar ali, no mesmo lugar, fazendo as mesmas coisas ou se ela devia tentar o pos doutorado fora do pais. A Mamãe achava que já sabia o que significava morar fora do pais da gente. E ela tinha ouvido falar de um programa de pos doutoramento muito interessante na cidade de Toronto, no Canadá, um pais distante, muito frio.
Ai a Mamãe pediu uma luz, um sinal de que era para seguir em frente. Afinal, a Mamãe já tinha Phoenix, Tuakinho e Alphinha. Então a Mamãe foi a um congresso em Araçatuba e como os alunos dela estavam apresentando trabalhos em salas diferentes, ela tinha que ficar correndo de uma sala para outra para dar assistência aos meninos. E ai quando ela entrou na sala onde o Flavio ia apresentar o trabalho dele, a coordenadora pediu licença para que um palestrante que havia se atrasado pudesse apresentar antes do Flavio. A Mamãe ficou com muita raiva porque ela não poderia sair para não ser indelicada, mas ela ia deixar de dar assistência aos outros alunos que estavam na outra sala, esperando a Mamãe.

Quando o professor começou a se apresentar, ele falou que era pos doutor em Comunicação Social, pela Universidade de Toronto. E a Mamãe nem podia acreditar. Conseguiu o endereço do programa e as informações básicas para se candidatar. Durante as férias do inicio do ano, a Mamãe ficou desenvolvendo o projeto de pesquisa. Todo dia a Mamãe ia para a PUC, pesquisar nos livros e pedir empréstimos dos livros que a PUC não possuía. Fez o projeto, enviou o trabalho e foi aceita. Hoje a Mamãe esta aqui.

Sabe, meus filhos, a realização de sonhos custa muito caro, mas nos coloca em situações que a gente jamais viveria no lugar onde estávamos. São os desafios que nos preparam não so para receber títulos, mas também para nos transformar em pessoas melhores por causa deles. E como se a gente fosse colocado dentro de um liquidificador. E a gente tem de fazer um esforço enorme para ficar de pe ali dentro. Entretanto, quando a gente sai dali, a gente passa a valorizar muito mais as pequenas coisas, alem de aprender outras que a gente nem imaginava.

Aqui onde a Mamãe mora agora, ela faz as mesmas coisas, `as mesmas horas, todos os dias. E a Mamãe que fica muito preocupada quando as situações começam a se repetir tem aprendido que ninguém entra em um mesmo rio duas vezes. Porque a gente muda todos os dias; porque aquela água em que nos banhamos, não e a mesma do dia anterior; porque a luz do sol, as pessoas que passam, a vegetação em torno são os mesmos. Meus filhos, a rotina não existe quando a gente tem consci^encia de a cada dia, quando o sol nasce, a gente nasce junto com ele. A Myosha de ontem. Não e a mesma de hoje. Porque a Mamãe ontem não tinha vivido as experi^encias do dia de hoje.

O outono não e uma estação muito valorizada ai porque a paisagem não muda muito. Aqui, viver o outono e ter consci^encia de que tudo e passageiro. (Menos o motorista e o trocador, e verdade!) E que, assim como as cores das folhas das arvores mudam a cada dia, nos também mudamos a cada momento. Todo dia quando olho da sacada do apartamento, vejo uma nova paisagem, porque as cores das folhas já mudaram ou porque elas já caíram das arvores e, por isso, eu já posso enxergar o quintal de algumas casas que eu nem percebia que estavam ali. E como se a cada dia a vida, nos mostrasse uma nova versão da realidade: aquela daquele dia. E que a gente não se apegue a ela, porque amanha será diferente. Como? A gente nunca sabe, mas tem que apostar para ver. E apostar significa pensar que os milagre não existem ou acreditar que a vida e um milagre: todas as situações, todas as pessoas `a nossa volta, todas as dádivas de cada dia.

Ai no Brasil, a Mamãe nunca valorizou o sabor das frutas e dos legumes, e muitas vezes esqueceu de agradecer, porque não tinha essa consci^encia. Hoje, vivendo no Canadá, pais de primeiro mundo, tecnologia avançada, a Mamãe tem a oportunidade de agradecer pelas pequenas grandes coisas que a cada dia faziam parte da vida da Mamãe ai no Terceiro Mundo. `As vezes, a Mamãe se pergunta porque esta aqui, sentindo saudades de vocês ai. Então, outro dia, o Julio falou para a Mamãe que ela jamais aprenderia ai no Brasil, as coisas que ela esta aprendendo aqui no Canadá. Não se trata do conhecimento dos livros, não! Ele estava falando do conhecimento e valorização de situações de vida, que a gente normalmente não valoriza nem agradece porque acha que são normais.
Eu tenho certeza, meus filhos, de que a Mamãe vai ser uma pessoa muuito melhor quando chegar ai, justamente por causa de cada um dos minutos que ela passou longe de vocês. A distancia nos da condição de perceber o conjunto das coisas que enriquecem a nossa vida. E como se fosse um quadro:
- A gente so percebe a beleza dele quando nos afastamos da tela. Ai, a gente tem a oportunidade de perceber cada detalhe. As diferenças de cor, as linhas e as curvas.

Pois e, meus lindos! A tarefa dessa semana já esta dada. Vamos apreciar, vamos aproveitar cada um dos minutinhos das nossas vidas onde quer que estejamos, vamos aproveitar para agradecer todas as vezes que o Tio Edimar leva vocês para o passeio, todos os dias de sol, todos os dias chuvosos. Vamos agradecer o compromisso, a seriedade e o carinho dele. Vamos saborear a ração fresquinha, os legumes gostosos, a caminha quentinha, a temperatura agradável, mesmo nos dias de calor intenso. Vamos aproveitar para agradecer todas as vezes que a Luciene chega e da bom dia e todas a vezes em que ela vai embora para voltar no dia seguinte. Vamos aproveitar todos os banhos gostosos, a água morninha e a mão que acaricia. Vamos aproveitar para agradecer todas as vezes que a Kellinha esquenta o pãozinho para vocês `a noite, todas as vezes que ela faz carinho em vocês, todas as vezes em que ela convida para brincar. E, antes de mais nada, vamos agradecer pela consci^encia de que a rotina não existe porque a cada dia o PAI DO CEU, nos coloca em contato com maravilhas que a gente não poderia conhecer no dia anterior.
“Não apresse o rio, ele corre sozinho...”
Vamos viver cada dia, de cada vez, com toda a nossa capacidade de amar aquele momento e as pessoas que fazem parte dele!

Que Deus os abençoe, cubra-os de Graça, Luz e Alegria!

PAZ & GRATIDAO,

Mamãe.
Toronto, 10 de novembro de 2006.

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